O minicurso pretende levar ao público as reflexões presentes na literatura e na filosofia da Grécia Antiga que surgiram a partir da narrativa e do exame de três males que marcam a história da humanidade e nos desafiam nos dias atuais acerca de sua inteira compreensão e resolução dos problemas que nos legam, trata-se da peste, da fome e da guerra. Pretende-se, em um primeiro momento, analisar as representações da peste nos textos literários e historiográfico – Ilíada de Homero, Édipo Rei de Sófocles e segundo livro da História da Guerra do Peloponeso de Tucídides. Em um segundo momento, deve-se examinar algumas das reflexões filosóficas que surgiram a partir do evento da Guerra do Peloponeso nas filosofias de Sócrates e de Platão e a proposição, de ambas, de uma nova política.
A partir das narrativas mítico-poéticas, podemos dizer que se uma terrível epidemia não tivesse acometido o exército grego acampado em Tróia, a ira de Aquiles jamais teria sido posta em ação e a obra fundadora da tradição poética grega, a Ilíada de Homero, restaria desprovida de seu tema principal, anunciado no verso de abertura do poema, já que do ponto de vista da cronologia dos fatos, a peste que assolava o acampamento precedeu e de algum modo causou a saída do maior herói grego da guerra.
Não menos central - e com relação a uma obra de importância talvez não menor do que a Ilíada - é o papel que a peste desempenha no Édipo Rei de Sófocles, pois é o sofrimento causado por ela sobre os cidadãos de Tebas que movimenta essa tragédia gerando o envio de Creonte a Delfos e seu retorno com a resposta do oráculo, segundo a qual a cidade só se livraria do mal se banissem ou matassem o(s) assassino(s) de Laio.
O Édipo de Sófocles pode também nos servir, em certo sentido, de passagem para um outro tipo de abordagem sobre as epidemias. Isto porque, em razão de algumas evidências encontradas na peça, de prováveis inovações no mito e da época de sua produção, é possível que a peste retratada na tragédia esteja a ecoar a violenta epidemia histórica que assolou Atenas em 430/429 a.C. no segundo ano da guerra do Peloponeso.
Essa peste e seus efeitos são descritos com riqueza de detalhes ao longo de oito parágrafos extensos do segundo livro da História da Guerra do Peloponeso, escrita por Tucídides. Aqui a visão mítica do mundo, adotada pelos poetas épicos e trágicos e dramáticos é deixada de lado e até mesmo posta em questão pelo historiador, que se atem aos fatos, mostra a ineficácia dos oráculos e elabora uma análise dos efeitos psicológicos, morais e sociais da enfermidade, com quebras de convenções em relação aos dois últimos campos citados. Trata-se, pois, de mostrar como a peste é abordada sob essas duas perspectivas, tanto a mítico-poético (nas duas obras citadas acima – o início da Ilíada de Homero e do Édipo Rei de Sófocles), como a historiográfica, com a passagem do segundo livro da obra de Tucídides. Nesse segundo caso, aproximações com a situação atual tornam-se possíveis, revelando a perspicácia do historiador grego, que por meio de suas observações nos dá a chance refletir sobre nossa condição atual.
Da perspectiva político-filosófica, pode-se conjecturar que os vinte e sete anos da Guerra do Peloponeso e os eventos que a antecederam mobilizaram, em grande medida, a efervescência cultural e científica da Atenas clássica. Contemporâneos desse período, Tucídides, Sócrates e Platão trazem impressões e reflexões acerca das principais questões que se tornaram o centro das preocupações dos homens de sua época. Entre elas está o problema da unidade política como o mais desafiador e provavelmente o mais premente. Desse modo, convém analisar a partir da filosofia de Sócrates e da filosofia política de Platão alguns dos temas que se desdobrem em torno do problema e se resumem em três questões: a natureza do conflito, uma nova virtude do homem grego e a cidade ideal.
Para tanto, a Guerra do Peloponeso estará em nossa análise como pano de fundo do contexto da Atenas do século V, na qual Sócrates representa, aos olhos de Platão, a síntese dos melhores valores do período áureo. Ao considerar Sócrates o ateniense por excelência, tem-se nos textos platônicos um relato da crítica socrática à tradição, à sociedade e aos valores vigentes, os quais exprimem o ethos socrático e tornam o velho filósofo o personagem constante dos diálogos. Do mesmo modo, e o que entre nós convida à reflexão, importa examinar o diálogo que a filosofia estabelece a partir da postura filosófica de Sócrates em relação à política, a saber, a ética como um fazer político.
Como herança, essa mesma perspectiva está presente na filosofia de Platão. Platão assiste a ruína de Atenas quando os atenienses são derrotados na segunda etapa da Guerra do Peloponeso e boa parte de sua obra se dedicará aos temas que envolvem, tal como apontou Tucídides no Livro I da História Guerra do Peloponeso, a falta de unidade entre os povos helenos e as possíveis causas da tensão política permanente. A crítica do fazer político vigente e a crítica dos valores morais são a matéria a partir da qual o filósofo edifica a sua cidade ideal n’A República ao propor uma nova política e uma nova moral, resumidas no paradigma da excelência moral do filósofo governante. Desse modo, propõe-se analisar nos textos platônicos as respostas teóricas a problemas políticos nesse contexto de guerra e pós-guerra.
1ª. Aula - 08/03/2021 - 14h - Reunião Google Meet
A peste no canto 1 da Ilíada de Homero e no Édipo Rei de Sófocles.
Pontos:
- encadeamento dramático no primeiro canto da Ilíada: o jogo de causas e efeitos no canto, a peste como precursora da ira de Aquiles, tema principal do poema;
- a visão mítico-religiosa da peste no poema épico: o insulto ao sacerdote como causa da peste, as flechas de Apolo como imagem da peste;
- a peste como motor da ação no Édipo Rei: o motivo da ida de Creonte da Delfos;
- a visão mítico-religiosa da peste no poema dramático: a influência délfica, a peste como resultado da mácula não expiada, o modo como é representada;
- a peste como possível inovação de Sófocles no mito: comparação com as fontes anteriores.
2ª. Aula - 09/03/2021 - 14h - Reunião Google Meet
A peste histórica de Atenas. (430/429 a.C)
Pontos: - a provável influência dessa peste na construção do enredo da tragédia;
- a peste descrita por Tucídides: a visão do historiador em contraste com a dos poetas; a vã adesão a práticas religiosas, descrição dos efeitos psicológicos, morais e sociais da enfermidade, com quebras de convenções em relação aos dois últimos campos.
Pontos de contextualização:
- a suposta origem (oriente);
- a suspeita de sabotagem (epidemia forjada);
- o caráter geral e diverso da doença (ataques de forma diferente contra indivíduos diferentes);
- a relação da doença com aquelas pré-existentes (comorbidades);
- o comportamento dos animais durante a epidemia (lá, alguns deles sumiram; aqui, voltaram a aparecer);
- a dificuldade de se encontrar um remédio;
- a confiança numa possível imunidade.
Aula 3 - 15/03/2021 - 14h - Reunião Google meet
O “humanismo” de Sócrates e a crítica da cultura: Sócrates e uma nova moral.
Diálogos: Críton, A Apologia de Sócrates e Fédon
- A guerra do Peloponeso como pano de fundo da Atenas Clássica;
- Sócrates representa, aos olhos de Platão, o período áureo da Atenas clássica;
- Sócrates, o ateniense por excelência; d) a crítica socrática à tradição, à sociedade e aos valores vigentes;
- o ethos socrático e o personagem dos diálogos.
Aula 4 - 16/03/2021 - 14h - Reunião Google Meet
O projeto de Platão sobre uma nova virtude e uma nova política: o governo do filósofo, a figura do guardião n’A República.
Diálogos: A República, O Banquete e o Livro I das Leis.
- Atenas perde a segunda etapa da Guerra do Peloponeso;
- Platão assiste a ruína de Atenas;
- crítica do fazer político vigente;
- crítica dos valores morais;
- a cidade ideal: a proposta de uma nova política e de uma nova moral;
- excelência moral do filósofo governante;
- a virtude da coragem e a figura de Alcebíades.
Alunos e pesquisadores das áreas de filosofia, psicanálise, psicologia, história antiga, arqueologia clássica, literatura e teatro.
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