CONSUMO ALIMENTAR DE CRIANÇAS INDÍGENAS DE ALAGOAS: ESTUDO TRANSVERSAL DE BASE POPULACIONAL
Consumo alimentar; Nutrição infantil; indígenas
Introdução: No Brasil, os povos originários apresentam maior vulnerabilidade social, quando comparados à população geral do país, situação que é refletida em diversos indicadores de saúde, a exemplo das maiores taxas de mortalidade precoce. Entre as crianças, são relativamente altos os relatos de altas prevalências de carências nutricionais, a exemplo da anemia e desnutrição energético-proteica. Além das dificuldades de acesso a uma alimentação adequada e saudável, a interação com a população não indígena vem causando modificações no estilo de vida desses povos, inclusive quanto aos seus hábitos alimentares. Estudos têm demonstrado que, na população geral, vem ocorrendo um aumento no consumo de alimentos ultraprocessados e que estes constituem importantes fatores de risco para diversas enfermidades. Dessa forma, preocupa a possibilidade de que tal fato também venha ocorrendo no âmbito dos povos indígenas, particularmente entre as crianças. Todavia, isso não está devidamente explorado na literatura científica. Diante disso, esse estudo teve por objetivo identificar o consumo alimentar de crianças indígenas do estado de Alagoas. Métodos: Trata-se de um estudo transversal, de base populacional, com amostra probabilística representativa das 11 etnias existentes no Estado. Para este estudo, foram elegíveis todas as crianças menores de 24 meses residentes nas comunidades sorteadas. A coleta de dados foi realizada de setembro de 2022 a novembro de 2023, por meio da aplicação de um formulário eletrônico por ocasião de visitas domiciliares. Foram coletados dados socioeconômicos, demográficos e relativos à mãe e à criança (variáveis independentes). A variável dependente foi o consumo de alimentos ultraprocessados, identificado com base no formulário “Marcadores do consumo alimentar para crianças menores de 24 meses” proposto pelo Ministério da Saúde. Os dados foram digitados em dupla entrada independentes em planilha do software Epi-info®, versão 3.5.4. As análises foram realizadas no programa Stata® 18.0. Após análise descritiva, aplicou-se o teste qui quadrado para identificar possíveis associações entre a variável dependente e as independentes. Foi considerado o nível de significância de 5,0% (p ≤ 0,05). Resultados: A amostra analisada foi composta por 133 crianças, correspondentes àquelas residentes nas 11 comunidades sorteadas. Observou-se que todas as crianças menores de seis meses tiveram introdução precoce de alimentos e que, entre aquelas de faixa etária superior, houve consumo de alimento ultraprocessado. Desta categoria, os mais frequentemente referidos foram o macarrão instantâneo, hambúrguer, biscoitos e bebidas açucaradas. Verificou-se associação positiva entre o consumo de ultraprocessado e a idade da criança (p=0,005). Filhos de mães que não conviviam com um companheiro também foram mais expostos ao consumo desses alimentos (p=0,042). Conclusão: Entre a crianças indígenas de Alagoas, há uma introdução precoce de alimentos, interrompendo o aleitamento materno exclusivo, e o consumo de alimentos ultraprocessados acontece antes dos dois anos de idade. Essa situação configura um cenário preocupante para a saúde dessas crianças, pois, além dos reflexos imediatos, hábitos alimentares inadequados estabelecidos desde a infância aumentam o risco de doenças na vida adulta, conforme a teoria do DOHaD (Origens Desenvolvimentistas da Saúde e Doença). Espera-se que esses achados incentivem ações para promover hábitos alimentares saudáveis, visando melhorar a saúde dessa população.