O IMPACTO DA RESTRIÇÃO ENERGÉTICA DE ALIMENTOS ULTRAPROCESSADOS NA MICROBIOTA INTESTINAL DE INDIVÍDUOS COM OBESIDADE COMPARADA A UMA RESTRIÇÃO ENERGÉTICA GENÉRICA: UM ENSAIO CLÍNICO ALEATÓRIO
Microbiota intestinal; Alimentos Ultraprocessados; Obesidade.
A obesidade é uma epidemia global crescente, caracterizada pelo acúmulo de gordura corporal, associada a distúrbios metabólicos e da microbiota intestinal. A disbiose, um desequilíbrio microbiano, pode ser influenciada por dietas ricas em alimentos ultraprocessados (AUP), que comumente são calóricos, pobres em nutrientes e relacionados a várias doenças. O Guia Alimentar da População Brasileira tem como principal recomendação evitar o consumo de AUP, no entanto, as evidências sobre os efeitos da restrição do consumo de AUP na microbiota intestinal são limitadas, e ensaios clínicos sobre a restrição de AUP são escassos. Sendo assim, o presente estudo teve como objetivo avaliar o impacto da restrição energética advinda de AUP na microbiota intestinal de indivíduos com obesidade em comparação com uma restrição energética genérica. Trata-se de um ensaio clínico aleatório, paralelo, com dois braços de investigação, que ocorreu no laboratório de Nutrição e Metabolismo da Universidade Federal de Alagoas. Foram incluídos indivíduos com obesidade, de ambos os sexos, com peso estável há um mês, alocados aleatoriamente em dois grupos: controle, com a restrição energética genérica (RE-G), e intervenção, com uma restrição energética advinda de AUP (RE-AUP), limitado a 5% de AUP. A microbiota intestinal foi avaliada no início e após 6 meses. Participantes coletaram amostras para extração de DNA e sequenciamento do gene 16S rRNA (V3-V4). Dados socioeconômicos, clínicos, antropométricos e de consumo alimentar também foram coletados. Os dados foram analisados através de análise de variância mista (ANOVA mista) e apresentados como média, IC95% e frequência, a depender da variável, com alfa igual a 5%. Para filo, gênero e família, aplicaram-se os métodos limma-voom e MaAsLin2, adotando-se p < 0,20 como limiar de correção de Benjamini-Hochberg. Foram aleatorizados 43 indivíduos: 22 para o grupo controle e 21 para o grupo intervenção. Após 6 meses, houve perdas de acompanhamento, e os dados completos de 34 indivíduos foram analisados. O consumo de AUP diminuiu no grupo que restringiu AUP, mas sem mudanças no grupo controle (p-interação = 0,04). A circunferência da cintura (CC) diminuiu em ambos os grupos (p < 0,01), assim como o % de gordura corporal (p < 0,01). De forma geral, houve um aumento na diversidade segundo os diversos índices usados. Por outro lado, a nível de gênero, observou-se um leve declínio na diversidade e da relação Firmicutes/Bacteroidetes ao longo do tempo, em ambos os grupos, mas essa mudança não foi estatisticamente significativa. Não houve diferenças significativas entre os grupos controle e intervenção em relação aos filos nos momentos baseline e 6 meses. A família Ruminococcaceae apresentou um aumento significativo no grupo que restringiu AUP em comparação ao grupo controle (p-interação = 0,03), assim como o gênero Faecalibacterium (p=0,02). Após ajustes de Benjamini-Hochberg para comparações múltiplas, o p-valor foi de 0,24 para MaAsLin2 e 0,10 para Limma-vom neste gênero. Esses achados destacam a complexidade das interações entre dieta, composição corporal e microbiota, sugerindo que a restrição de AUP pode ter efeitos positivos, mas limitados, na modulação da microbiota em curto/médio prazo.