O ROMANCE HETERONÍMICO DE LÍNGUA PORTUGUESA:
DESASSOSSEGOS A PARTIR DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
António Lobo Antunes. Romance português contemporâneo. Heteronímia. Desassossego.
Esta pesquisa faz uma leitura teórica e crítica das obras literárias do escritor português António Lobo Antunes (1942-), a fim de conceituar e exemplificar o que consideramos ser, nesta Tese, um romance heteronímico no âmbito das Literaturas de Língua Portuguesa. Observamos, nos romances antunianos publicados a partir dos anos 2000, uma constante necessidade de o autor trazer, para a arena romanesca, personagens que também são autores/as literários/as — uma heteronímia que incide na obra não apenas pela temática, mas sobretudo pela estética circunscrita na autonomia de um autor-secundário (Bakhtin, 2023), que cria a si, aos seus e ao seu criador — um tal “Lobo Antunes literário” que é mencionado por suas personagens. Para tanto, observamos nos romances Não entres tão depressa nessa noite escura (2000), Eu hei-de amar uma pedra (2004), Ontem não te vi em Babilónia (2006), O meu nome é Legião (2007) e Que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar? (2009), uma escrita caótica, experimental, hibrida e polifônica: espelho das angústias de suas personagens, germinando nelas o ímpeto de escrever. Essa “escrita do desassossego”, portanto, faz-se acepção teórica, a partir de Sigmund Freud (1929), Fernando Pessoa (1982) e Ana Medeiros (2017), tendo em vista que o fenômeno da heteronímia, no romance antuniano, mostra-se resultado da literatura desassossegada. Sabemos que analisar a heteronímia romanesca somente se faz possível considerando-se a grande reflexão teórica (e prática) que se formou a partir do fenômeno produzido por Fernando Pessoa, na primeira metade do século XX, em língua portuguesa. Assim, esta pesquisa responde à leitura crítica feita por Casais Monteiro (1985) e Eduardo Lourenço (2017), que interpretam a heteronímia como “fenômeno literário”. Da mesma forma, aludimos à teoria romanesca de Mikhail Bakhtin, compreendida entre os anos de 1919 a 1975, para melhor teorizarmos acerca da categoria do autor e dos cronotopos que sedimentam, no romance polifônico e alteritário, o fenômeno de instâncias autorais aqui discutido. Cumpre destacar que, além dos contributos já elencados, valer-nos-emos dos estudos de Ana Paula Arnaut (2009) e Carlos Reis (2004), dentre outros pesquisadores da fortuna crítica de Lobo Antunes, que incitam o pensamento sobre: autoria, memória e guerra colonial.