Um exercício dialógico sobre a figura da Ama em Perdição, de Hélia Correia
Teatro Português Contemporâneo, Hélia Correia, Ama, Antígona, Dialogismo.
Este trabalho constitui estudo da figura da Ama em Perdição: exercício sobre Antígona (1991), peça teatral da escritora portuguesa Hélia Correia. Em ritmo de ensaio, a dissertação segue o rastro das amas de distintas eras, oferecendo um recorte dessa personagem marginal a partir da Ilíada e da Odisseia de Homero e contornando a máscara da trophós nas tragédias atenienses, com ênfase nas Coéforas, de Ésquilo, Medeia e Hipólito, de Eurípides. A investigação segue pela renascença dessa personagem em Romeu e Julieta de Shakespeare, amparada pelos estudos de Bárbara Heliodora, Raymond Willians e Walter Benjamin. O drama contemporâneo responde, ainda, pela figuração da velha nutriz na Era dos Extremos, nos palcos franceses, em Antigone (1944), de Jean Anouilh. Nesta pesquisa, então, evidenciaremos o resgate inacabado e dialógico (no sentido preconizado por Mikhail Bakhtin) da Ama clássica, no encalço dos rastros da personagem no teatro português contemporâneo. Seguimos o método da montagem literária preconizada por Benjamin, especialmente na ênfase de rememorar a história dos vencidos, sob a égide do materialismo histórico. Para embasar o pensamento benjaminiano, elegemos as obras Lembrar, escrever, esquecer (2006), de Jeanne Marie Gagnebin, e Walter Benjamin: aviso de incêndio - uma leitura das teses Sobre o conceito de história, de Michael Löwy. Com amparo de Erich Auerbach, lançamos mão do conceito de “figura” e avançamos na observação das amas desde Euricleia (de Homero). Ajudam-nos a entender as dinâmicas sociais e artísticas do mundo grego as pesquisas de Pierre Vidal-Naquet, Claude Mossé e Jacquelline Romilly. No âmbito da fortuna crítica de Hélia Correia, recorremos centralmente às pesquisas de Maria de Fátima Silva, que realizou o prefácio de Perdição (2006) e organizou a coletânea de estudos Furor: ensaios sobre a obra dramática de Hélia Correia (2006). Finalmente, considerando-se que, em Perdição de Hélia Correia, contracenam uma ama e sua senhora mortas, propomos uma travessia à luz da tanatografia e das vozes dos Diálogos do Mortos de Luciano de Samósata, no encalço dos estudos dos pesquisadores brasileiros Augusto Silva Júnior e Ana Clara Medeiros.