Avaliação da importância da sarcopenia associada à qualidade de vida e estresse oxidativo em portadores de doença hepática crônica
Doença hepática crônica. sarcopenia. Extresse oxidativo. Qualidade de vida.
Responsável por síntese proteica, produção de bile, balanço glicídico, armazenamento de micronutrientes, produção de colesterol, desintoxicação e metabolismo de alguns hormônios, entre outras, o fígado desempenha papel de suma importância na homeostase do organismo. A agressão constante ao fígado por álcool, hepatites virais, doenças metabólicas e autoimune pode levar a danos irreversíveis, com comprometimento da função hepática. A história natural da doença hepática crônica é caracterizada por uma longa fase assintomática (silenciosa) ou compensada (VUILLELESSARD; RODRIGUES; BERZIGOTTI, 2021), que pode evoluir para a descompensação clínica, fase caracterizada pela manifestação sistêmica do dano hepático. Uma das principais consequências da doença hepática crônica avançada (DHCA) é a hipertensão portal, que é responsável pelas principais complicações na descompensação clínica que se manifesta com ascite, encefalopatia hepática e hemorragia digestiva por rutura das varizes esófago-gástricas. Após o primeiro episódio de descompensação a doença progride mais rapidamente, aumentando a morbimortalidade e o paciente deve ser avaliado quanto a possibilidade de transplante hepático (TxH). A transição de cirrose compensada para cirrose descompensada ocorre numa taxa de 5 a 7% ao ano (D’AMICO; GARCIA-TSAO; PAGLIARO, 2006) . A progressão da doença descompensada pode ser ainda mais acelerada pelo desenvolvimento de outras complicações como ressangramento, lesão renal aguda, com ou sem as características de síndrome hepatorrenal, síndrome hépato-pulmonar, hipertensão portopulmonar, cardiomiopatia cirrótica e infeções bacterianas (ANGELI et al., 2018). Os indivíduos com doença hepática crônica muitas vezes passam a ter restrições alimentares, inatividade física e restrições sociais. As restrições alimentares podem ocorrer tanto qualitativamente, com mudanças sem planejamentos adequados, como quantitativamente, por maior plenitude gástrica pela ascite. Há uma série de fatores que levam à desnutrição em pacientes com cirrose, que é difícil identificar à beira do leito, a menos que se manifeste fenotipicamente como fragilidade e/ou sarcopenia. Outros fatores associados a desnutrição ou independentes dela podem contribuir com a fragilidade e/ou sarcopenia, como inflamação sistêmica, desequilíbrio metabólico e inatividade física (LAI et al., 2021). A sarcopenia é definida como distúrbio muscular esquelético progressivo e generalizado associado a uma maior probabilidade de complicações, como quedas, fraturas, incapacidade e mortalidade, combinando massa e força muscular ou desempenho muscular (CRUZ-JENTOFT et al., 2019). Ela está presente em 30-70% dos cirróticos, e a sobrevida em pacientes com sarcopenia em 1, 3 e 5 anos é de 76,6%, 64,3% e 45,3%, respectivamente (TANTAI et al., 2022). Adicionalmente, a presença de sarcopenia se comporta como um fator preditivo pós transplante, resultando em maior rejeição do enxerto (MEEKS; MADILL, 2017). Na meta-análise publicada em 2021, TANTAI et al observaram maior mortalidade em todo espectro do Model for End-stage Liver Disease (MELD), enfatizaram a necessidade de triagem e tratamento da sarcopenia em todos os estágios da cirrose, para reduzir o risco de morte 2,34 vezes maior naqueles com MELD <15 e para prevenir o excesso de morte entre os pacientes com MELD mais elevado (≥15). Atualmente o padrão ouro de avaliação do índice de massa esquelética no cirrótico é a tomografia computadorizada (TC), porém com limitações (disponibilidade reduzida, alto custo e exposição a radiações) na prática clínica. Medidas de massa muscular que não sejam imagens de corte transversal, como na TC, foram estudadas em pacientes com cirrose. A avaliação da massa livre de gordura por análise de bioimpedância elétrica (BIA), incluindo BIA segmentar, mostrou uma correlação modesta com a massa muscular e está associada à mortalidade em pacientes com cirrose. A retenção de líquidos afeta a confiabilidade das estimativas de massa corporal magra por BIA. A medida do ângulo de fase pela bioimpedância elétrica tem boa confiabilidade nesses pacientes, mesmo naqueles com ascite (LAI et al., 2021). O fígado é um órgão vital que é mais frequentemente atacado por espécies oxidativas reativas (EROs), o que acaba resultando em estresse oxidativo devido à sua alta camada de gordura. As células do parênquima do fígado são o alvo primário para o ataque de espécie reativa de oxigênio (EROS), levando à lesão hepática. Os micromomes e peroxissomos no fígado, consequentemente, levam ao excesso de produção de EROS pela regulação do PPAR ÿ. Da mesma forma, poucas células são mais propensas à lesão oxidativa, que inclui células de Kupffer, células estreladas hepáticas e células endoteliais. Geralmente, a superprodução de EROS leva à ativação de uma série de citocinas, como o fator de necrose tumoral (TNF), que aumenta a inflamação e a apoptose. A produção excessiva de EROS leva à peroxidação lipídica que, em última análise, desencadeia a proliferação e a síntese de colágeno das células estreladas hepáticas. Correspondentemente, a homeostase da célula também será perturbada devido à produção excedente de EROS, que desempenha um papel importante na doença hepática e outros distúrbios degenerativos (SMILIN BELL ASEERVATHAM; ARUL ANANTH; SIVASUDHA, 2018). As células hepáticas adquirem uma série de mecanismos de equilíbrio para lidar com uma quantidade excessiva dessas espécies reativas e de seus produtos finais por meio de antioxidantes enzimático, como superóxido dismutase (SOD) (SMILIN BELL ASEERVATHAM; ARUL ANANTH; SIVASUDHA, 2018). O estresse oxidativo – definido como um desequilíbrio entre os agentes próoxidantes e os antioxidantes em favor dos primeiros –, correlaciona-se positivamente com o aumento da síntese de colágeno hepático e, consequentemente, progressão do tecido fibrótico e assim da doença hepática (GALICIA-MORENO; ROSIQUE-ORAMAS; MEDINA-AVILA; ALVAREZ-TORRES et al., 2016) e está elevado em pacientes a espera do TxH (AYDIN; DIRIK; DEMIR; TOLUNAY et al., 2021). Independente da etiologia da doença hepática, os pacientes apresentam comprometimento da qualidade de vida. Isso está associado a progressão da doença, presença de sintomas, resposta ao tratamento e fatores mentais, físicos e sociais, como ansiedade, comorbidades e fadiga, além de limitações na vida diária, incluindo solidão, baixa renda, estigmatização e custos do tratamento (GRØNKJÆR; LAURIDSEN, 2021). Não foram encontrados estudos na literatura vigente que avaliassem a magnitude do estresse oxidativo segundo o comprometimento muscular e a qualidade de vida em pacientes candidatos a TxH, quando comparados a pacientes com doença hepática crônica avançada, com hipertensão portal, mas com MELD< 15.